Por Mariana Sanches
Apesar dos comentários de Joe Biden contra a política ambiental de Jair Bolsonaro e a torcida do presidente brasileiro pela reeleição de Donald Trump, o novo governo americano afirma que não terá uma política externa "agressiva" em relação ao Brasil e que o país segue sendo considerado um aliado de Washington em âmbito internacional.
Em entrevista à BBC News Brasil, a porta-voz do Departamento de Estado americano para a América Latina, Kristina Rosales, afirmou que "conforme vão mudando os governos de um país ou de outro, vai haver uma mudança de prioridades. É normal. Mas isso não significa que porque o governo e as prioridades mudaram, a relação com o país que tem um governo com prioridades distintas vai ser completamente destruída, ou que vai mudar de forma a não haver mais possibilidade de aliança".
Nesta quinta-feira (11/02), após três semanas de gestão Biden, o chanceler Ernesto Araújo e o secretário de Estado americano Tony Blinken deram o primeiro passo na relação em alto nível entre os governos.
"Tive hoje longa e produtiva conversa com o Secretário de Estado Antony Blinken. Agenda 100% positiva. Ficou claro que há excelente disposição e amplas oportunidades para continuarmos construindo uma parceria profunda entre o Brasil e os Estados Unidos", anunciou Araújo via Twitter.
Rosales afirmou ainda que reduzir a influência chinesa na América Latina - especialmente no tema da rede 5G brasileira - segue sendo prioridade para os EUA, embora os passos tomados para atingir o objetivo devam ser mudados.
É possível que a aliança Clean Network, criada por Trump pra excluir empresas chinesas do fornecimento de equipamentos a aliados, e endossada em novembro por Ernesto Araújo e o deputado Eduardo Bolsonaro, deixe de existir.
A diplomata americana comentou ainda as mudanças no sistema de imigração para os EUA. Biden enviou ao Congresso um projeto de lei para garantir uma via para cidadania a quase 11 milhões de pessoas que vivem hoje no país sem documentos. A medida é a mais progressista da história, mas Rosales afima que isso não significa dizer "as portas estão abertas, que venha todo mundo".
"O que esse governo quer comunicar é que os Estado Unidos estão trabalhando numa política para restauração do processo de migração, que vai ser organizado e justo, que não vai ser aquele processo que vai todo mundo pra fronteira e entra quem ganhar no '1,2,3 e já'", diz Rosales.
Ela descartou ainda a possibilidade de conversa entre Washington e Caracas para tentar resolver a crise humanitária que levou à diáspora de cerca de seis milhões de venezuelanos. "A gente não tem diálogo com o ditador da Venezuela".
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
Sobre Amazônia
Rosales - Acho que tudo ainda está sendo trabalhado, detalhes virão nos próximos meses. Houve o lançamento há dez dias do Green Climate Fund (um programa no qual países desenvolvidos canalizariam recursos para um fundo que remuneraria países em desenvolvimento para preservar florestas e reduzir emissões de gases do efeito estufa). Mas especificamente sobre esse comentário do presidente não há nada que eu possa acrescentar, de um fundo específico para o Brasil.
Em um sentido mais global, a questão ambiental está sendo tratada como prioridade por esse governo e vai haver participação de outros países. Não vai ser algo unilateral, só dos EUA, mas de outros países, também brasileira. E não só porque o Brasil tem a Amazônia, mas por ser uma economia global.
Sobre o Brasil
Rosales - Os EUA e Brasil têm uma parceria já de mais de dois séculos, que é bem vibrante e com muitos valores e interesses compartilhados. As administrações podem mudar, e a relação fica intacta, já que há vários compromissos entre os dois países de muitos anos, sobre temas que são importantes não só para os dois países mas para todo o hemisfério em geral. Conforme vão mudando os governos de um país ou de outro, vai havendo uma mudança de prioridades, isso é normal. Mas isso também não significa necessariamente que porque o governo e a prioridade mudaram, a relação com o país que tem um governo com prioridades distintas vai ser completamente destruída, ou vai mudar de uma forma que não vai haver mais possibilidade de aliança, de amizade histórica entre Estados Unidos e Brasil. Independente do que vem pela frente, os desafios que vão ser tratados para a região e para a relação bilateral, esses dois governos vão conseguir lidar com isso com respeito mútuo. Então isso é algo que a gente vai observar, obviamente, com os temas sobre os quais os dois líderes não concordam - e isso inclui certos temas que são mais sensíveis -, mas sabemos que os dois países irão trabalhar juntos.
Fonte: BBC News Brasil em Washington